sexta-feira, 27 de abril de 2012

Mais exercícios!!!

Então pessoal, como falamos ontem, aqui está o gabarito das questões, espero que tenham acertado:
1-a
2-b

E aqui vão mais duas questões, só pra continuarmos no ritmo de aprendizado.

Até a próxima postagem.

Bons estudos!!! 


Exercícios sobre Fernando Pessoa e seus heterônimos:

1- “Olho o Tejo, e de tal arte Que me esquece olhar olhando, E súbito isto me bate De encontro ao devaneamento — Que é ser — rio, e correr? O que é está-lo eu a ver?”

As relações entre o homem e a natureza sempre estiveram presentes nas obras literárias. Nos versos acima, de Fernando Pessoa, ortônimo, a visão do rio Tejo produz, no eu-lírico do poema:

a) indiferença, porque não gera nenhuma reflexão.

b) oposição entre a sua alma e a do rio.
c) saudade, visto ter sido o Tejo a porta de saída dos portugueses para as grandes conquistas.
d) integração com a natureza que o leva a refletir sobre a existência e a contemplação do rio.
e) desilusão, porque o homem está matando o rio.

Resposta: D

2- I. “Ah, o mundo é quanto nós trazemos. Existe tudo porque existo”.
II. “Da minha pessoa de dentro não tenho noção de realidade. Sei que o mundo existe, mas não sei se existo”.

Lendo comparativamente os dois fragmentos, e considerando a proposta poética pessoana, pode-se afirmar que:
a) Tanto em Alberto Caeiro como em Fernando Pessoa “ele mesmo”, o eu é sempre uma identidade “fingida”.
b) Há uma espécie de neo-romantismo em Fernando Pessoa, devido ao centramento no eu.
c) Observa-se uma permanência do naturalismo do século XIX, devido ao naturismo de Caeiro.
d) Em ambos, observa-se uma mesma relação entre o eu e o mundo.

Resposta: A

quinta-feira, 26 de abril de 2012

EXERCÍCIOS


Hoje, para exercitamos um pouco do que estamos aprendendo sobre Fernando Pessoa e seus heterônimos, vamos começar respondendo a essas duas questões, amanhã segue o gabarito.
Boa sorte!!

1) Assinale a alternativa correta a respeito das três afirmações abaixo.

I – Os heterônimos de Fernando Pessoa nascem de um múltiplo desdobramento de sua personalidade.
II – Alberto Caeiro é o poeta que se volta para o campo, procurando viver em simplicidade.
III – Ricardo Reis é um poeta moderno, que do desespero extrai a própria razão de ser.



a) Apenas a I e a II estão corretas.
b) Todas estão corretas.
c) Apenas a I e a III estão corretas.
d) Nenhuma está correta.
e) Apenas a II e a III estão corretas.

2) Os excertos a seguir são de autoria de dois dos muitos heterônimos de Fernando Pessoa:

“Em febre e olhando os motores como a uma Natureza tropical
- Grandes trópicos humanos de ferro e fogo e força -
Canto, e canto o presente, e também o passado e o futuro, ”.

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“Negue-me tudo a sorte, menos vê-la,
 Que eu, stóico sem dureza,
 Na sentença gravada do Destino
 Quero gozar as letras”.



Os heterônimos em questão são respectivamente:

a) Alberto Caeiro e Bernardo Soares
b) Ricardo Reis e Alberto Caeiro
c) Bernardo Soares e Antonio Mora
d) Álvaro de Campos e Ricardo Reis
e) Antônio Mora e Alvaro de Campos



REFERÊNCIAS:
http://simplesmenteportugues.blogspot.com.br/2009/04/literatura-3-serie-do-ensino-medio.html



quinta-feira, 19 de abril de 2012

Álvaro de Campos

Fernando Pessoa criou Álvaro de Campos que ficou conhecido como o maior heterónimo do poeta. Segundo Pessoa Álvaro nasceu em 1890, estudou engenharia mecânica, formou-se em engenharia naval e viveu na Escócia, morreu em 1935. 
Uma curiosidade sobre esse poeta, Álvaro foi o único entre as criações de Pessoa que apresentou três diferentes fases em sua obra, sendo assim passou pelo decadentismo, depois pelo Futurismo e, por último, pela chamada  Fase Abúlicólica .

Segundo o site Prof2000, segue a biografia completa desse poeta.



Álvaro de Campos surge quando Fernando Pessoa sente “um impulso para escrever”. O próprio Pessoa considera que Campos se encontra no extremo oposto, inteiramente oposto, a Ricardo Reis”, apesar de ser como este um discípulo de Caeiro.
Campos é o “filho indisciplinado da sensação e para ele a sensação é tudo. O sensacionismo faz da sensação a realidade da vida e a base da arte. O eu do poeta tenta integrar e unificar tudo o que tem ou teve existência ou possibilidade de existir.
Este heterónimo aprende de Caeiro a urgência de sentir, mas não lhe basta a sensação das coisas como são: procura a totalização das sensações e das percepções conforme as sente, ou como ele próprio afirma “sentir tudo de todas as maneiras”.
Engenheiro naval e viajante, Álvaro de Campos é configurado “biograficamente” por Pessoa como vanguardista e cosmopolita, espelhando-se este seu perfil particularmente nos poemas em que exalta, em tom futurista, a civilização moderna e os valores do progresso.
Cantor do mundo moderno, o poeta procura incessantemente “sentir tudo de todas as maneiras”, seja a força explosiva dos mecanismos, seja a velocidade, seja o próprio desejo de partir. “Poeta da modernidade”, Campos tanto celebra, em poemas de estilo torrencial, amplo, delirante e até violento, a civilização industrial e mecânica, como expressa o desencanto do quotidiano citadino, adoptando sempre o ponto de vista do homem da cidade.

TRAÇOS DA SUA POÉTICA
-   poeta modernista
-   poeta sensacionista (odes)
-   cantor das cidades e do cosmopolitanismo (“Ode Triunfal”)
-   cantor da vida marítima em todas as suas dimensões (“Ode Marítima”)
-   cultor das sensações sem limite
-   poeta do verso torrencial e livre
-   poeta em que o tema do cansaço se torna fulcral
-   poeta da condição humana partilhada entre o nada da realidade e o tudo dos sonhos (“Tabacaria”)
-   observador do quotidiano da cidade através do seu desencanto
-   poeta da angústia existencial e da auto-ironia

1ª FASE DE ÁLVARO DE CAMPOS – DECADENTISMO (“Opiário”, somente)
- exprime o tédio, o enfado, o cansaço, a naúsea, o abatimento e a necessidade de novas sensações
- traduz a falta de um sentido para a vida e a necessidade de fuga à monotonia
- marcado pelo romantismo e simbolismo (rebuscamento, preciosismo, símbolos e imagens)
-   abulia, tédio de viver
-   procura de sensações novas
-   busca de evasão
“E afinal o que quero é fé, é calma/ E não ter estas sensações confusas.”
“E eu vou buscar o ópio que consola.”

2ª FASE DE ÁLVARO DE CAMPOS
-FUTURISTA/SENSACIONISTA
Nesta fase, Álvaro de Campos celebra o triunfo da máquina, da energia mecânica e da civilização moderna. Sente-se nos poemas uma atracção quase erótica pelas máquinas, símbolo da vida moderna. Campos apresenta a beleza dos “maquinismos em fúria” e da força da máquina por oposição à beleza tradicionalmente concebida. Exalta o progresso técnico, essa “nova revelação metálica e dinâmica de Deus”. A “Ode Triunfal” ou a “Ode Marítima” são bem o exemplo desta intensidade e totalização das sensações. A par da paixão pela máquina, há a náusea, a neurastenia provocada pela poluição física e moral da vida moderna.
- celebra o triunfo da máquina, da energia mecânica e da civilização moderna
- apresenta a beleza dos “maquinismos em fúria” e da força da máquina
- exalta o progresso técnico, a velocidade e a força
- procura da chave do ser e da inteligência do mundo torna-se desesperante
- canta a civilização industrial
- recusa as verdades definitivas
- estilisticamente: introduz na linguagem poética a terminologia do mundo mecânico citadino e cosmopolita
- intelectualização das sensações
- a sensação é tudo
- procura a totalização das sensações: sente a complexidade e a dinâmica da vida moderna e, por isso, procura sentir a violência e a força de todas as sensações – “sentir tudo de todas as maneiras”
- cativo dos sentidos, procura dar largas às possibilidades sensoriais ou tenta reprimir, por temor, a manifestação de um lado feminino
- tenta integrar e unificar tudo o que tem ou teve existência ou possibilidade de existir
- exprime a energia ou a força que se manifesta na vida
- versos livres, vigorosos, submetidos à expressão da sensibilidade, dos impulsos, das emoções (através de frases exclamativas, de apóstrofes, onomatopeias e oxímoros)
·        Futurismo
-   elogio da civilização industrial e da técnica (“Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r eterno!”, Ode Triunfal)
-   ruptura com o subjectivismo da lírica tradicional
-   atitude escandalosa: transgressão da moral estabelecida
·        Sensacionismo
-   vivência em excesso das sensações (“Sentir tudo de todas as maneiras” – afastamento de Caeiro)
-   sadismo e masoquismo (“Rasgar-me todo, abrir-me completamente,/ tornar-me passento/ A todos os perfumes de óleos e calores e carvões...”, Ode Triunfal)
-   cantor lúcido do mundo moderno

3ª FASE DE ÁLVARO DE CAMPOS – PESSIMISMO
Perante a incapacidade das realizações, traz de volta o abatimento, que provoca “Um supremíssimo cansaço, /íssimo, íssimo, íssimo, /Cansaço…”. Nesta fase, Campos sente-se vazio, um marginal, um incompreendido. Sofre fechado em si mesmo, angustiado e cansado. (“Esta velha angústia”; “Apontamento”; “Lisbon revisited”).
O drama de Álvaro Campos concretiza-se num apelo dilacerante entre o amor do mundo e da humanidade; é uma espécie de frustração total feita de incapacidade de unificar em si pensamento e sentimento, mundo exterior e mundo interior. Revela, como Pessoa, a mesma inadaptação à existência e a mesma demissão da personalidade íntegra., o cepticismo, a dor de pensar e a nostalgia da infância.
- caracterizada pelo sono, cansaço, desilusão, revolta, inadaptação, dispersão, angústia, desânimo e frustração
- face á incapacidade das realizações, sente-se abatido, vazio, um marginal, um incompreendido
- frustração total: incapacidade de unificar em si pensamento e sentimento; e mundo exterior e interior
-   dissolução do “eu”
-   a dor de pensar
-   conflito entre a realidade e o poeta
-   cansaço, tédio, abulia
-   angústia existencial
-   solidão
-   nostalgia da infância irremediavelmente perdida (“Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira!”, Aniversário)

TRAÇOS ESTILÍSTICOS
-   verso livre, em geral, muito longo
-   assonâncias, onomatopeias (por vezes ousadas), aliterações (por vezes ousadas)
-   grafismos expressivos
-   mistura de níveis de língua
-   enumerações excessivas, exclamações, interjeições, pontuação emotiva
-   desvios sintácticos
-   estrangeirismos, neologismos
-   subordinação de fonemas
-   construções nominais, infinitivas e gerundivas
-   metáforas ousadas, oximoros, personificações, hipérboles
-   estética não aristotélica na fase futurista
-  
Linhas Temáticas
Expressividade da linguagem
"     O canto do Ópio;
"     O desejo dum Além;
"     O canto da civilização moderna;
"     O desejo de sentir em excesso;
"     A espiritualização da matéria e a materialização do espírito;
"     O delírio sensorial;
"     O sadomasoquismo;
"     O pessimismo;
"     A inadaptação à realidade;
A angústia, o tédio, o cansaço;
"     A nostalgia da infância;
"     A dor de pensar.
Nível fónico
a)        Poemas muito extensos e poemas curtos;
b)        Versos brancos e versos rimados;
c)         Assonâncias, onomatopeias exageradas, aliterações ousadas;
d)        Ritmo crescente/decrescente ou lento nos poemas pessimistas
Nível morfossintáctico
a)        Na fase futurista, excesso de expressão: enumerações exageradas, exclamações, interjeições variadas, versos formados apenas com verbos, mistura de níveis de língua, estrangeirismos, neologismos, desvios sintácticos;
b)        Na fase intimista, modera o nível de expressão, mas não abandona a tendência para o exagero.
Nível semântico
a)        apóstrofes, anáforas, personificações, hipérboles, oximoros, metáforas ousadas, polissíndetos.





quinta-feira, 12 de abril de 2012

O Pagão, Ricardo Reis.



Ricardo Reis;

Ricardo Reis (19 de setembro de 1887) é um dos três heterônimos mais conhecidos de, Fernando Pessoa, tendo sido imaginado de relance pelo poeta em 1913 quando lhe veio à ideia escrever uns poemas de índole pagã.
Este personagem de Fernando Pessoa teria sido criado em 1912. Pessoa considera este heterônimo como o primeiro que a ele se revelou, ainda que não tenha sido o primeiro a iniciar a sua atividade literária. Ricardo Reis estaria latente desde o ano de 1912, mas só em março de 1914 o autor das Odes iniciaria a sua produção. Em outro texto, Pessoa afirma que Ricardo Reis “nasceu” dentro dele em 1914. Também a respeito da biografia do heterônimo Fernando Pessoa apresenta dados distintos, ora diz que nasceu em Lisboa, ora no Porto.  De acordo com Pessoa, Ricardo Reis foi educado em um colégio de jesuítas, recebendo, pois, uma formação clássica e latinista e imbuído de princípios conservadores, elementos que são transportados para a sua concepção poética.
Reis é marcado por uma profunda simplicidade da concepção da vida, por uma intensa serenidade na aceitação da relatividade de todas as coisas. Médico de profissão, o heterônimo era monárquico, fato que o levou a se auto-isolar por anos no Brasil. Na sua biografia não consta a sua morte, no entanto José Saramago fez uma intervenção sobre o assunto no livro “O ano da morte de Ricardo Reis”, situando a morte de Reis em 1936.


Sobre as Obras;

As primeiras obras de Reis foram publicados em 1924, na revista Athena, fundada por  Fernando Pessoa. Mais tarde foram publicados oito odes, entre 1927 e 1930, na revista Presença, de Coimbra. Os restantes poemas e prosas são de publicação póstuma.
Sua obra apresenta um epicurismo triste, uma vez que busca o prazer relativo, uma verdadeira ilusão da felicidade por saber que tudo é transitório. A apatia, ou seja, a indiferença constitui o ideal ético, pois, de acordo com o Poeta, há necessidade de saber viver com calma e tranquilidade, abstendo-se de esforços inúteis para obter uma glória ou virtude, que nada acrescentam à vida.
Ricardo Reis refugia-se na aparente felicidade pagã que lhe atenua o desassossego. Procura alcançar a quietude e a perfeição dos deuses, desenhando um novo mundo à sua medida, que se encontra por detrás das aparências. Afirma uma crença nos deuses e nas presenças quase-divinas que habitam todas as coisas. Afirma que os homens se devem considerar "deidades exiladas", com direito a vida própria.
Considera que sendo o destino "calmo e inexorável" acima dos próprios deuses, temos necessi­dade do autodomínio, de nos portarmos "altivamente" como "donos de nós-mesmos", construindo o nosso "fado voluntário". Devemos procurar, voluntariamente, submetermo-nos, ainda que só possamos ter a ilusão da liberdade.
Pagão por caráter e pela formação helénica e latina, há na sua poesia uma actualização de estoicismo e epicurismo, juntamente com uma postura ética e um constante diálogo entre o passado e o presente.

As formas das obras;

As Poesias de Ricardo Reis seguem sempre uma forma: a ode.
A ode surgiu na Grécia e etimologicamente a palavra “ode” significa “canção”. Era, pois em regra um poema lérico, frequentemente cantado e acompanhado por música. Como teve vários autores originais, a ode tomou o nome desses autores, nas suas diversas variações. Assim temos a ode alcaica (Alceu), sáfica (Safo), asclépiadeia (Asclepíades) e pindárica (Píndaro).
Da Grécia a ode evolui, em Roma, com Horácio, que utilizou sobretudo a ode alcaica, com quatro versos. É deste cânone – a estrofe alcaica Horaciana – que Ricardo Reis tira a sua métrica: odes de quatro versos, dois decassilábicos e dois hexassilábicos com versos brancos e sem rima. Há exceções, porém esta é a sua métrica dominante.  
A ode define-se também por seguir uma estrutura régida em três partes: estrofe, antiestrofe e epodo – tema, desenvolvimento (resposta ao tema) e conclusão do poema.


Análise da Obra;

Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio.
(Ricardo Reis)

Vem sentar-te comigo, Lídia, à beira do rio.
Sossegadamente fitemos o seu curso e aprendamos
Que a vida passa, e não estamos de mãos enlaçadas.
(Enlacemos as mãos).

Depois pensemos, crianças adultas, que a vida
Passa e não fica, nada deixa e nunca regressa,
Vai para um mar muito longe, para ao pé do Fado,
Mais longe que os deuses.

Desenlacemos as mãos, porque não vale a pena cansarmo-nos.
Quer gozemos, quer não gozemos, passamos como o rio.
Mais vale saber passar silenciosamente
E sem desassossegos grandes.

Sem amores, nem ódios, nem paixões que levantam a voz,
Nem invejas que dão movimentos demais aos olhos,
Nem cuidados, porque se os tivesse o rio sempre correria,
E sempre iria ter ao mar.

Amemo-nos tranquilamente, pensando que podíamos,
Se quiséssemos, trocar beijos e abraços e carícias,
Mas que mais vale estarmos sentados ao pé um do outro
Ouvindo correr o rio e vendo-o.

Colhamos flores, pega tu nelas e deixa-as
No colo, e que o seu perfume suavize o momento -
Este momento em que sossegadamente não cremos em nada,
Pagãos inocentes da decadência.

Ao menos, se for sombra antes, lembrar-te-ás de mim depois
Sem que a minha lembrança te arda ou te fira ou te mova,
Porque nunca enlaçamos as mãos, nem nos beijamos
Nem fomos mais do que crianças.

E se antes do que eu levares o óbolo ao barqueiro sombrio,
Eu nada terei que sofrer ao lembrar-me de ti.
Ser-me-ás suave à memória lembrando-te assim - à beira-rio,
Pagã triste e com flores no regaço
.

12/06/1914
Poema XII do projeto de 1914.


Ode de certo modo emblemática de Reis, este poema sintetiza em si mesmo alguns dos principais temas mais queridos a este heterónimo, nomeadamente a passagem da vida alheia, a quem nela vive e a eterna mudança da realidade, em que nada permanece alguma vez igual.
É um diálogo do poeta com Lídia. Nota-se que tanto Lídia como o seu interlocutor são "crianças grandes", que nunca se tocam nem se beijam. – destaque feito pelo iminente critico Pessoano Angel Crespo.
Os seguintes temas estão nesta Ode:
1) o medo do futuro para além da segurança da infância ("Sofro, Lídia, do medo do destino);
2) o ideal de "uma vida passiva e silenciosa" (Angel Crespo) ("Deixem-me os deuses minha vida sempre sem renovar);
3) a infância como idade ideal, para os espíritos puros (como ele e Lídia, ambos simbolicamente crianças) (Ficando eu quase sempre o mesmo/Indo para a velhice como um dia entre no anoitecer).
A presença de Lídia recorda a fixação do belo, um fino símbolo do amor presente, mas intocado, que assim permanece eterno.
Reis convida Lídia a sentar-se e convida-a apenas a comtemplação do rio. O rio é então comparado à vida e a simples metáfora sintetiza na perfeição o epicurismo filtrado de Reis – a fruição limitada dos prazeres da vida, apenas na devida dimensão da necessidade racional.
O enlace das mãos – um gesto terno, mas que não toma uma dimensão sensual, muito menos erótica – representa a união dos dois seres num ato de pensamento deliberado. Simples como um ritual, o gesto de Reis é simbólico em si mesmo – a cristalização da infância como período fundamental da vida, período edílico a que se retorna sempre em temor de dificuldades.
Através deste poema, podemos sentir em Ricardo Reis o seu esforço de adaptação à vida, numa tentativa de evitar os efeitos do destino. Por isso, a poesia deste heterónimo tem um tom triste e quase apático já que o “eu” poético não se permite viver intensamente.



Referencias:

Maria Oliveira e Maria Pereira; “Fernando Pessoa: O amor interdito?” in Actas do IV Congresso Internacional de Estudos Pessoanos, II Vol., Fund. Eng. Antônio de Almeida, 1991.


quinta-feira, 5 de abril de 2012

Poema "Quando vier a Primavera", de Alberto Caeiro.

Alberto Caeiro, o Mestre


         
         Para iniciar a biografia de hoje, vamos definir o que significa “heterônimo”. Quando falamos em pseudônimo, falamos em nomes diferentes para uma mesma personalidade, há quem pense que foi isto o que fez Fernando Pessoa, assinar sob pseudônimos diferentes, ledo engano, na verdade a façanha de Pessoa foi a de ter vários heterônimos, que ao contrario de pseudônimos, constituem varias pessoas em um único poeta. Assim explicou Pessoa: “Por qualquer motivo temperamental que me não proponho analisar, nem importa que analise, construí dentro de mim várias personagens distintas entre si e de mim, personagens essas a que atribuí poemas vários que não são como eu, nos meus sentimentos e idéias”.
Hoje falaremos do mestre dos heterônimos e do próprio Fernando Pessoa: Alberto Caeiro.

1-Personagem real

Segundo a cronologia mais divulgada, Pessoa situou a 16 de Abril de 1889, em Lisboa, o nascimento de Caeiro. Dentre todos os seus heterônimos este é o mais ignorante no sentido de ser o menos culto, órfão de pai e mãe, não exerceu nenhuma profissão e estudou apenas até a 4ª série. Era um homem simples, criado no campo, viveu grande parte de sua vida no Riba Tejo, na quinta de sua tia-avó idosa, e nele vivia alheio à alta sofisticação cultural. Teve uma vida curta, morreu em Lisboa em junho de 1915, quando contava apenas 26 anos, de tuberculose.
Pessoa descrevia Caeiro como magro, de estatura média, frágil apesar de não aparentar o quão o era, não usava barba, era louro e tinha olhos azuis. Segundo toda esta descrição fica difícil entender o porquê de Alberto Caeiro ser o mestre dos outros heterônimos e do próprio Fernando Pessoa Ortônimo, mas Pessoa nos explica que ele é mestre de paganismo, nos ensina uma visão não cristã, não judaica, não espiritualizada da vida e do mundo. Para Caeiro, o mundo não é um enigma, um mistério que devemos tentar desvendar, nem o que vemos tem um sentido oculto pro trás das aparências. Desta forma Caeiro conseguiu submeter o pensar ao sentir e isso lhe permitiu viver sem dor, envelhecer sem angustia e morrer sem desespero, não procurava encontrar sentido para as coisas que o rodeavam, era inteiro, não fragmentado e sentia sem pensar.
Foi o poeta do real objetivo, pois em suas obras demonstrava aceitar a realidade e o mundo exterior como são com alegria ingênua e contemplação, recusando a subjetividade e a introspecção, o misticismo foi banido do seu universo; e também foi o poeta da natureza, porque  integra-se nas leis do universo como se fosse um rio ou uma árvore, rendendo-se ao destino e à ordem natural das coisas.
Demonstrava também através de seus poemas, viver no presente, não querer saber do passado ou do futuro, apenas de um tempo objetivo que coincide com a sucessão dos dias e das estações, a natureza é a sua verdade absoluta. Desejava abolir a consciência dos seus próprios pensamentos (o vício de pensar), pois deste modo todos seriam alegres e contentes.

Dentre suas principais características estilísticas estão:

-Estilo discursivo;
-Pendor argumentativo;
-Transformação do abstrato no concreto, frequentemente através da comparação;
-Predomínio do substantivo concreto sobre o adjetivo;
-Linguagem simples e familiar;
-Liberdade estrófica e métrica e ausência de rima;
-Predomínio do Presente do Indicativo;
-Raro uso de metáforas.

Sua obra é composta por 104 poemas, sendo 49 em O guardador de Rebanhos, 6 em O Pastor Amoroso e 49 em Poemas Inconjuntos.

2-Análise da obra

Quando vier a Primavera
(Alberto Caeiro)

Quando vier a Primavera,
Se eu já estiver morto,
As flores florirão da mesma maneira
E sãs arvores não serão menos verdes que na primavera passada
A realidade não precisa mais de mim.

Sinto uma alegria enorme
Ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma

Se soubesse que amanhã morria
E a Primavera era depois de amanhã,
Morreria contente, porque ela era depois de amanhã.
Se esse é o seu tempo, quando havia ela de vir senão no seu tempo?
Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo;
E gosto porque assim seria, mesmo que eu não gostasse.
Por isso, se morrer agora, morro contente,
Porque tudo é real e tudo está certo.

Podem rezar latim sobe o meu caixão, se quiserem.
Se quiserem, podem cantar e dançar à roda dele.
Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências.
O que for, quando for, é que será o que é.


        Vamos iniciar a analise deste poema analisando juntamente as duas primeiras estrofes, temo na primeira: “Quando vier a Primavera,/Se eu já estiver morto,/As flores florirão da mesma maneira/E sãs arvores não serão menos verdes que na primavera passada/A realidade não precisa mais de mim.” E na segunda: ”Sinto uma alegria enorme/Ao pensar que a minha morte não tem importância nenhuma”. Essas duas estrofes fazem introdução ao poema e à uma temática ao qual Caeiro gostava muito que era a sua posição face a natureza. Sua maior ambição era deixar de pensar, acreditava demasiadamente na necessidade de simplificar a vida. Ao descrever a chegada da primavera e imaginar-se morto, o eu-lirico transmite uma sensação de naturalidade, pois a natureza não pensa e todos os seus processos são conjuntos e não individuais. Na natureza a ausência de um ser não para a evolução dos demais, então o eu-lirico pensa que se a natureza ignora sua morte é porque ela o aceita como seu constituinte.
        Na terceira estrofe temos: “Se soubesse que amanhã morria/E a Primavera era depois de amanhã,/Morreria contente, porque ela era depois de amanhã./Se esse é o seu tempo, quando havia ela de vir senão no seu tempo?/Gosto que tudo seja real e que tudo esteja certo;/E gosto porque assim seria, mesmo que eu não gostasse./Por isso, se morrer agora, morro contente,/Porque tudo é real e tudo está certo.” E no quarto: “Podem rezar latim sobe o meu caixão, se quiserem./Se quiserem, podem cantar e dançar à roda dele./Não tenho preferências para quando já não puder ter preferências./O que for, quando for, é que será o que é.” Temos como característica principal nestas estrofes a aceitação do destino, que é um outro ponto fundamental na visão do mundo de Alberto Caeiro. Na sua visão do mundo o homem não luta contra o destino, antes, o aceita sem discussão, na sua inevitabilidade. Não aceitar o destino seria pensar na vida e não aceitá-la tal como ela é. Este objetivismo absoluto de Caeiro é por vezes difícil de compreender, mas é, também, imensamente simples. 



REFERENCIAS

RODRIGUES, M., CASTRO, D., ACHCAR, F., JUNIOR, J. de P. R. Literatura Portuguesa. Ed. Ática. 2ª edição. São Paulo, 1997.